quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Minhas Leituras






















A Marca humana e A Trégua: a vida como derrota

I

Dois homens na segunda fase da vida. Um setenta em três, o outro cinquenta. Ambos envolvem-se com mulheres que têm metade de suas idades. Relação que possibilita ao mesmo tempo uma trégua e uma queda a estes personagens. Estamos falando de Coleman Silk e Martín Santomé. O primeiro personagem principal do romance de Philip Roth, A marca Humana (2002); o segundo é personagem-narrador de A Trégua (2011), de Mário Benedetti.

Coleman Silk vem a lume pela narrativa do narrador-escritor Natan Zuckeman, um possível alter ego de Roth. Ele nos revela a tragédia de Silk, um professor universitário prestes a se aposentar. Silk assumia o cargo de Decano e queria se aposentar fazendo o que sempre fez: ministrar aulas de literatura clássica. Por usar o termo spooks para refereir-se as dois alunos que nunca frenquentaram suas aulas (e não imaginava quem eram), Silk é acusado de racismo. Devido ao processo, Silk pede demissão e sua mulher morre de um avc e ele revolta-se. Mas surge-lhe uma trégua. Silk conhece a faxineira da universidade em que trabalhava e mantém com ela uma relação tumultuosa. A essa mulher, ele revela um segredo que carregara durante toda a vida.

Martin Santomé um viúvo às via de se aposentar indaga-se sobre o que fazer com o tempo que estará a seu dispor despois da aposentadoria. Com três filhos já adultos e viúvo a mais de vinte anos, Santomé sofre a solidão. Enquando aguarda o período para solicitar aposentadoria, ele apaixona por uma nova funcionária da empresa de contabilidade em que trabalha. Essa paixão,correspondida, cria uma suspensão, uma trégua na ordem natrural das coisas desse sujeito cada vez mais próximo da morte. O romance construído como um diário-íntimo nos apresenta, por assim dizer, esse tempo em suspenso na vida de Santomé.

II

Tégua é um intervalo entre guerras, entre tumultos. Para Silk a trégua aparece sobre o nome de Faunia Faley. Para Santomé pela jovem Avellaneda.

III

Coleman Silk e MArtin Santomé revelam o quanto são pesados os condicionamento ontológicos, históricos e sócias. Cada um a sua maneira. Um mais efusivo. O outro mais contido. A marca humana deles, e nossa.

Santomé passa a vida num trabalho que realiza sem prazer pela obrigação de sustentar e educar os filhos, após a morte da primeira mulher. Com a aparição de Laura Avellaneda ousa uma rebeldia, uma transgressão, um salto que é ao mesmo tempo uma queda.

Silk, de forma mais efusiva, ao renegar a família para esconder a descendência negra, ao não aceitar se retratar na acusação de racismo, ao relacionar-se com Faunia Farley, uma relação que podería trazer-lhe sérios próblemos, inclusive a morte, já que Faunia era perseguida por um ex-marido ex-combatente do Viatnã.

IV

A trégua explora, à sua maneira, a alienação do homem contemporâneo. A trégua é justamente o intervalo entre a alienação do trabalho e o vazio da aposentadoria. Por isso, Santomé anuncia o fim do diário após a morte de Avellaneda. Só lhe resta o vazio e sobre isso ele não qur escrever.
A marca humana, com a narrativa contextualizada no período em que o presidente americano Bill Clinton é envolvido num escândalo sexual. Uma das questões do livro é justamente este tempo hipócrita politicamente correto.

Mesmo fadados à derrota, mesmo condenados pelo destino e pela própria condição, Silk e Santomé são sujeitos que tentam tomar o rumo de suas próprias vidas. São conscientes de sua própria condição. Ao escrever diário e ao narrar parte de sua vida a Natan Zuckeman, Santomé e Silk revelam uma condição paradoxal: a de herói-vítima.

V

Ambos os romances tem o tumulto como elemento central. Ou seja, o mal, o excesso humano, a força transgressora.

Nas anotações finais de seu diário Santomé escreve:

É evidente que Deus me concedeu uma destino escuro. Nem sequer cruel. Simplesmente escuro. É evidente que me concedeu uma trégua. A princípio relutei em acreditar que isso pudesse ser a felicidade. Resistir com todas as forças, depois me dei por vencido e acreditei. Mas não era felicidade, era apenas uma trégua. Agora estou outra fez medido em meu destino. E é mais escuro do que antes.
Em a Marrca humana, este tumulto e definido por Faunia Farley:

[…] Impureza, crueldade, maus-tratos, erros excrementos, esperma – não tem jeito de não deixar. Não é uma questão de desobediência. Não tem nada a ver com graça nem salvação, nem redenção. Está em todo mundo. Por dentro, inerente. Definidora. A marca que está lá antes do seu sinal. Mesmo sem nenhum sinal, ela está lá. A marca é tão intrínseca que não precisa de sinal. A marca precede a desobediência e confunde qualquer explicação.


VI

Ambos os romances nos revelam que “a vida humana como tal é uma derrota. A única coisa que nos resta diante dessa inelutável derrota que chamamos vida é tentar compreendê-la. Eis aí arte de ser do romance” (KUNDERA, 2006, p. 17).














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