Feliz Ano Novo
Com ou sem votos de feliz ano novo, a vida vai continuar a
mesma. Com suas perdas e seus ganhos. Ou ganhos e perdas. Porque as coisas são
assim. Mas ainda assim vamos desejar os votos de final de ano. Ajuda-nos a
renovar a esperança e a fé.
Em 2015, meu filho fez um ano, aprendeu a andar, a correr.
Está reinventando o mundo com sua linguagem e seu espanto original. Desejo que,
em 2016, ele complete dois anos, ensinando-me a pedagogia do desaprender – este
pequeno Caeiro. Que minha filha complete dez anos e continue atenta a eterna
novidade do mundo.
Em 2015, o sonho do carro soçobrou. A ilusão de que
pertencemos ao grupo privilegiado. Que se realize em 2016, antes de pagar as
setenta e duas prestações. O sonho da casa própria também não saiu do papel,
aliás, do sonho. Que, em 2016, ao menos um arquiteto ou um projetista
transforme-o numa folha de papel manteiga ou em um desenho num programa gráfico
de computador.
Em 2015, não tive doença grave, não sofri acidente – apesar
dos riscos de pilotar uma moto –, não fui assaltado, nem morto em uma esquina
qualquer por uma infeliz coincidência ou por uma deliberada barbárie. Que, em
2016, Deus, a sorte, o acaso, as felizes coincidências me protejam. E as armas
e roupas de São Jorge, a mim e a todos. Mas acho que o santo vai ter modernizar
a fundição e a confecção.
Que, em 2016, não aumente meu mapa de ausências: o pai, o
avô, a avó, um tio, um primo, um amigo. Que eu mesmo não me perca em meu mapa
de ausências. Que 2016 seja um ano de rever um parente distante, mesmo que seja
num enterro. Mas acho que o melhor e ler as Intermitências
da morte, de Saramago ou, como diria os portugas antigos, o melhor é crer
em Cristo.
Que, em 2016, mesmo
que tenha certeza que as coisas mudem pouco, eu seja um professor melhor e que
tenha alunos melhores. Que sejamos capazes de partilhar o sabor do saber.
Por mais que fique com a certeza de tudo piorar, como afirma
o poeta, por mais que os políticos se escondam nos discursos fajutos dos
situacionistas e dos oposicionistas, nas bandeiras dos partidos e nas próprias
conveniências, por mais que todos sejam da mesma legião, ainda assim desejo um
ano menos sujo para o país.
Enfim, desejo que 2016 seja melhor que 2015, mesmo que a vida
vá além do que desejo. Desejo, porque é do humano desejar.
No dia da virada, impassíveis no céu límpido ou sobre as
nuvens, as estrelas brilharão como sempre fizeram, mesmo antes de estarmos
aqui. À mesa, faltarão alguns convivas.
Mas como lembra Quintana:
O bom das segundas-feiras, do primeiro dia de cada mês e do Primeiro do Ano é que nos dão a ilusão de que a vida se renova... Que seria de nós se a folhinha estivesse marcando hoje o dia 713.789 da Era Cristã?"
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